Em um artigo no site de estudos acadêmicos The Conversation, a pesquisadora Hanna Bailey (Oxford Internet Institute – OII) alertou: “A remoção de Donald Trump das plataformas de mídia social reacendeu o debate em torno da censura de informações publicadas online, mas a questão da desinformação e manipulação nas mídias sociais vai muito além da conta de um homem no Twitter, e é muito mais difundida do que se pensa”. Informações do Media Talks.
Bailey faz parte da equipe que tem monitorado nos últimos quatro anos a proliferação global de campanhas de manipulação política de mídia social – definidas como propaganda computacional, por utilizarem ferramentas e estratégias digitais para influenciar o comportamento do público online.
Para os pesquisadores, a desinformação industrializada está se tornando mais profissionalizada e produzida em cada vez maior escala pelos principais governos, partidos políticos e firmas de relações públicas por eles contratadas, e deve causar preocupação crescente para as democracias em todo o mundo.
Essa é a principal conclusão do último relatório do Oxford Internet Institute, o Inventário Global de Manipulação Organizada da Mídia Social 2020, de autoria de Philip Howard, Hanna Bailey e Samantha Bradshaw.
O documento revela as maneiras como agências governamentais e partidos políticos têm usado de forma crescente as mídias sociais para espalhar desinformação política, poluir o ecossistema de informação digital e suprimir a liberdade de expressão e de imprensa.
O relatório registra a participação de empresas de comunicação e de relações públicas contratadas pelos governos para apoiar a produção de desinformação industrializada e profissionalizada. Mas lembra que embora as mídias sociais possam aumentar a escala e o escopo da desinformação, muitas das questões no centro da propaganda computacional – polarização, desconfiança e declínio da democracia – são anteriores às mídias sociais e até mesmo à própria internet.
O Brasil é apontado como país de média capacidade de organização, com tropas atuando ao longo de todo o ano para influenciar o debate político, incluindo membros do governo, partidos, firmas contratadas e influenciadores voluntários. O OII afirma que quatro das cinco estratégias principais de manipulação são utilizadas no País.
Para Hanna Bailey, apesar de o escândalo Cambridge Analytica ter exposto como as empresas privadas podem interferir em eleições democráticas, a pesquisa encontrou um aumento alarmante no uso de serviços de “desinformação de aluguel” em todo o mundo:
“Usando financiamento do governo e de partidos políticos, tropas cibernéticas do setor privado estão cada vez mais ajudando a espalhar mensagens manipuladas online ou a abafar outras vozes nas redes sociais:”
Três tendências principais verificadas em 81 países
O estudo descreve as ferramentas, capacidades, estratégias e recursos usados em 2020 para manipular politicamente a opinião pública. E identifica as tendências recentes da propaganda computacional em 81 países:
“1. A atividade das tropas cibernéticas continua a aumentar em todo o mundo. Em 2020, foram encontradas evidências do uso das mídias sociais para espalhar propaganda computacional e desinformação política em 81 nações. Isso aumentou em relação ao relatório do ano anterior, no qual essas atividades tinham sido identificadas em 70 países.
2. No ano passado, as empresas de mídias sociais adotaram medidas importantes para combater o uso indevido de suas plataformas por tropas cibernéticas. O Facebook e o Twitter anunciaram que entre janeiro de 2019 e novembro de 2020 removeram mais de 317.000 contas e páginas de suas plataformas. Por outro lado, quase US$ 10 milhões foram gastos em publicidade com finalidade política por tropas cibernéticas que operam nos países analisados.
3. As empresas privadas desenvolvem cada vez mais campanhas de manipulação. Em 2020 foram identificadas empresas realizando propaganda computacional em nome de um ator político em 48 países, quase o dobro do ano anterior. Desde 2018, mais de 65 empresas oferecem propaganda computacional como serviço. No total, considerando apenas os informes oficiais, quase US$ 60 milhões foram gastos por governos na contratação dessas empresas desde 2009″.